Câmara de Uberlândia rejeita proposta para reduzir assessores
Cada vereador tem direito a 15 auxiliares, com salários que chegam a R$ 7 mil.
Sete mil reais. Esta é a quantia que um assessor de vereador em Uberlândia pode receber por mês. Na prática, nada de errado, já que o valor que alguém deve receber pelo próprio trabalho é subjetivo. O problema está no número destes funcionários a que cada parlamentar tem direito: 15 para cada vereador. O batalhão de assessores custa caro para os cofres públicos da cidade e cria distorções no mercado de trabalho.
Para quem terminou um curso superior e não consegue colocação há cerca de dois anos, o sentimento é de indignação. É o caso das amigas Gabrielle Cintra e Thaís Leão, que se conheceram no curso de Agronomia e precisaram “se virar” para conseguir pagar as contas.
“Eles pedem uma experiência por exemplo de um ano, dois anos, só que não me dão a oportunidade de mostrar pra eles que eu sou capaz, que eu posso ter essa experiência”, diz Gabrielle.
A alternativa que elas encontraram foi criar um serviço de venda de frutas, legumes e verduras pela internet. Mas a realidade das agrônomas poderia ser diferente se elas fossem amigas de um vereador. Na Câmara Municipal de Uberlândia são 405 vagas de assessor parlamentar, com salários que chegam R$ 7.000. Diploma ou qualificação não são exigidos.
Para Thaís Leão, o sentimento de injustiça prevalece. “Eu acho muito injusto porque a gente batalha tanto, porque a sociedade hoje em dia coloca que a gente tem que ter uma profissão, tem que estudar, aí a gente batalha por essa profissão, por esse diploma e depois ele não vale de nada”, afirma a agrônoma.
As 405 vagas poderiam ter sido reduzidas para 270 se um Projeto de Lei que tramitava na Casa tivesse prosperado. A iniciativa previa um corte de cinco assessores para cada vereador. Hoje, cada parlamentar tem direito a 15 auxiliares. A proposta reduziria para 10, mas recebeu parecer pelo arquivamento da Assessoria Jurídica da Câmara Municipal.
Segundo o Procurador-geral da Câmara de Uberlândia, Tiago Nunes, a proposta tem inconsistências jurídicas que impedem a votação. Segundo ele, o texto apresenta “uma redução no que diz respeito a quantidade, mas em contrapartida o aumento no que diz respeito a alguns cargos. Considerando a Lei Complementar 173, identificamos a não possibilidade da tramitação desse projeto porque ocasionaria aumento de despesa pública”.
Os custos
Apesar de diminuir a quantidade de assessores, a proposta da casa aumentava os salários dos profissionais. Atualmente, os 15 auxiliares ganham entre R$ 1.500 e R$ 7.000, dependendo da função desempenhada. Com a mudança que estava tramitando na Câmara, os 10 assessores ganhariam entre R$ 1.800 e R$ 7.200. O aumento, em média, seria de 35%.
Os salários dos assessores custam para os cofres públicos de Uberlândia cerca de R$ 1,5 milhão por mês. Com a redução na quantidade, mas reajustando os salários, o custo seria de pouco mais de R$ 1,1 milhão.
O jornalismo do Grupo Paranaíba fez os cálculos de quanto o Legislativo poderia economizar se a mesma proposta fosse apresentada, sem o aumento de salários. Nesse caso, a despesa com 10 assessores seria de pouco mais de R$ 750 mil. Em um ano, a economia da Câmara passaria de R$ 9 milhões.
O dinheiro é suficiente para construir cinco UBSFs, as Unidades Básicas de Saúde da Família. Cada uma com 590 metros quadrados, que poderiam atender 75 mil pessoas. O vice-presidente da Câmara, vereador Leandro Neves (PSD), concorda com a redução, mas tem sido uma voz solitária entre os colegas da Mesa Diretora.
“Dentro desse princípio da eficácia com o tratamento do dinheiro público e a redução de gastos, principalmente no momento de pandemia, eu sou a favor da redução de custos. Se for pra reduzir assessores sem reduzir os custos, não vejo propósito. Se for pra reduzir assessores e reduzir os custos da Casa, a minha posição é favorável”, argumenta Neves.
As ilegalidades
Os altos salários de assessores e a quantidade exagerada podem incentivar também a prática de crimes conhecidos pelo brasileiro. As limitações começam pelo espaço físico: os pequenos gabinetes dos vereadores no prédio da Câmara de Uberlândia não comportam nem mesmo cinco pessoas. Quinze, seria impensável.
Com pouco ou nenhum trabalho, muitos são “fantasmas“: ganham, mas não trabalham. Outros aceitam fazer a chamada “rachadinha“, para repassar parte do dinheiro recebido ao patrão. Em maio deste ano, a Promotoria de Justiça começou a investigar essas suspeitas. O promotor do Patrimônio Público, Daniel Marotta Martinez, explicou na época que as apurações iniciais poderiam dar início a um Procedimento Investigatório Criminal.
“Queremos fazer um levantamento de informações em bancos de dados e outros aspectos, porque sabemos que embora haja indícios veementes de uma prática na Câmara Municipal, há um grande número de servidores que são efetivamente contratados, cumprem sua carga horária normalmente, recebem seus salários e não repassam nada aos vereadores”, diz Marotta.
Outra característica dos cargos de assessor parlamentar é o uso da remuneração para pagar compromissos de campanha no vereador. Em troca de apoio, o representante eleito oferece emprego a seus “cabos eleitorais“. Segundo a cientista política Angela Liberatti, além das práticas ilegais, esta é uma dificuldade de reduzir o número de assessores. Ela sugere a formação de equipes técnicas, que poderiam trabalhar para todos os parlamentares.
“Cada casa legislativa, por exemplo, cada Câmara Municipal poderia ter um grupo de assessores concursados, bem formados em várias áreas e que todos os vereadores utilizam esse grupo para sua assessoria. Não há necessidade de cada vereador ter uma assessoria das várias funções, das várias atividades sociais”, explica Angela.
Caso seja reformulada, a proposta pode ser levada para votação em Plenário. Por maioria, os vereadores decidem quantos assessores terão e o salário que cada um deles vai receber. Para Liberatti, o julgamento cabe ao eleitor.
“Nem tudo aquilo que está na Lei é legítimo. Está na lei que você pode ter um número grande de assessores, mas não necessariamente isso é legítimo. Os eleitores têm que aprovar”, finaliza.