Alexandre Garcia
Causa própria X Causa pátria
É fácil entender porque o povo das redes sociais está pedindo que ninguém seja reeleito.
É fácil entender porque o povo das redes sociais está pedindo que ninguém seja reeleito. Não é apenas perda de confiança; é a convicção de que os representantes não exercem a representação em nome dos eleitores, mas em nome próprio e de seus supostos partidos – que não são partidos, mas ações-entre-amigos, com poucas e honrosas exceções. Agora mesmo a reforma política mostra isso. Tentada há mais de 20 anos, agora foi acolhida como emergência para salvá-los da perda do mandato na próxima eleição. A lista fechada é o principal casuísmo para esconder os nomes que têm aparecido na Lava-jato.
Para se protegerem da lei e da Justiça, querem mudar as leis. Caixa-2 seria crime só a partir de uma nova lei, esquecendo o passado e esquecendo que caixa-2 e crime de sonegação são a mesma coisa. Para se blindar da Justiça, resolveram atualizar a Lei de Abuso da Autoridade, que é do governo Castello Branco, em 1965. Atualizando, acham uma forma de se proteger de juízes, do ministério público e da polícia. A proposta deveria se chamar de Projeto do Valhacouto. Outra proposta paralela tem dificuldade, porque se acabar com foro privilegiado, vão direto para os braços de Sérgio Moro, mas se ficarem no Supremo ou STJ perdem a chance de protelar o cumprimento da pena por anos de recursos e afins.
O projeto da terceirização, utilíssimo para a economia brasileira, só andou porque muitos parlamentares são proprietários de empresas de terceirização e tinham interesse pessoal. Mas outro projeto, o da Reforma da Previdência, absolutamente necessário para equilibrar as contas federais e facilitar o crescimento, tropeça em interesses pessoais da burocracia da Câmara e do Senado, privilegiados com aposentadorias integrais e muitas vezes acrescidas de vantagens oportunistas.
E, além dessa fisiologia personalista que destoa com a determinação da Constituição de que o serviço público tem que ser impessoal, ainda há uma cegueira ideológica caquética. Na discussão desta semana sobre o Uber, deputados mostraram o quanto detestam a concorrência, querendo limitá-la e regulamentá-la. Todos sabem que concorrência livre é bom para o consumidor. Há representantes do povo que pensam que o povo é alienado e precisa ser tolhido da liberdade de escolha. Houve até quem propusesse limitar a tarifa máxima, como se o consumidor fosse um idiota que não possa decidir o quanto pode pagar. Por isso o Brasil é 79º em IDH e a Austrália, país de liberdades, é o segundo. Milhões de assinaturas originaram um projeto de iniciativa popular para combater a corrupção. Foi todo deformado. Tudo legislação em causa própria e nada em causa pátria.