Alexandre Garcia
As candinhas
Por dever profissional, acompanho o noticiário do dia. E cada vez mais ele me traz saudades da juventude, quando pontificavam, nos Estados Unidos, as duas rivais em mexericos: Louella Parsons e Hedda Hoper.
Alexandre Garcia
Por dever profissional, acompanho o noticiário do dia. E cada vez mais ele me traz saudades da juventude, quando pontificavam, nos Estados Unidos, as duas rivais em mexericos: Louella Parsons e Hedda Hoper. Eram publicadas em jornais e revistas americanos e brasileiros com o gossip, que significa fofoca na nossa língua. Por aqui, havia a famosa página Mexericos da Candinha, na popular Revista do Rádio. Tão famosa que foi festejada em música de Roberto Carlos: “…a Candinha gosta mesmo de falar/ela diz que sou maluco/e que o hospício é o meu lugar/….A Candinha quer fazer da minha vida um inferno/ já está falando do modelo de meu terno”… e assim por diante.
Os mexericos, as fofocas, ficavam restritos a páginas especiais; a da Revista do Rádio e em algumas colunas sociais dos jornais. Hoje, encontro isso no noticiário político. Não há fato; apenas diz-que-disse. Achismo que tenta virar fato para ser construída uma notícia. Aprendi, na faculdade, que os fatos são fortes por si. Não precisam de ajuda, porque quem ajuda o fato, o deturpa. E a reportagem do fato é sempre mais forte que o repórter. E o achismo ainda vai além: adentra à telepatia: “O ministro pensa que….”. Ora, o ministro não disse. O ministro pensa; logo, alguém tem o dom de ler pensamento do ministro.
Denzel Washington, o talentoso ator americano, lembra que a veracidade é a exigência primeira do jornalismo, mas hoje a exigência nº 1 é a premência. É preciso publicar em primeiro lugar e não há tempo para conferir se é verdade – lembra Denzel. Há mais de 20 anos, eu fazia uma palestra para alunos do último semestre de jornalismo, na Universidade de Brasília. Há um estudante que me perguntou sobre os pilares do jornalismo, eu enumerei a veracidade em primeiro lugar; depois a clareza, a simplicidade, a objetividade, a isenção e a neutralidade. Fui interrompido pelo professor que coordenava a aula: “Eu não ensino meus alunos a serem isentos e neutros. Ensino meus alunos a serem militantes. Militantes ideológicos contra o status quo opressor.” Misture-se a militância com a fofoca, o mexerico, a leitura de pensamento e temos o modismo das fake news infiltrando-se por aí. E as consequências são terríveis. Não para os fatos, porque eles são inalteráveis, mas para a credibilidade, que é o maior patrimônio dos meios de informação. Porque quando os fatos se mostrarem, quem se sentir enganado, vai ficar muito zangado e vai deixar de acreditar. E aí, como cantou Roberto Carlos “Eu não vou ligar pra mexerico de ninguém”.