Alexandre Garcia
16 de novembro de 2017 - 10:56

A nova censura

Estou em Lisboa, onde acaba de se realizar o Web Summit. Recolhi dele uma...

            Estou em Lisboa, onde acaba de se realizar o Web Summit. Recolhi dele uma constatação: “Esta será  a melhor ou a pior coisa que alguma vez acontecerá à humanidade.” No programa de semana passada na GNews, um de meus convidados, promotor de Justiça, lembrou que não há censura legal, pois é proibida pela Constituição, mas a censura da própria sociedade, através das redes sociais. A definição de censura, no Aurélio, não se fixa apenas em proibição; é também repressão, crítica, condenação. O dicionário não inclui no verbete xingamentos, ofensas, violência verbal ou física. Essas reações são incivilizadas, mas não são piores que o aproveitamento político-ideológico disfarçado de censura crítica normal, construtiva. Estão fazendo uso das redes para impor ideias totalitárias e para tentar tolher liberdades individuais, como a de opinião e a de expressão. A ideia é intimidar os mais fracos.
            Com as câmeras dos celulares, ninguém mais está só; a vida privada é uma raridade; podem filmar qualquer situação e expor nas redes. Ou guardar para a ocasião oportuna. Se houver má intenção, você pode ser filmado tomando cerveja, e depois filmado na direção de um carro, ainda que não seja no mesmo dia. A edição nas redes sociais pode mostrar que você dirige depois de beber. Se for celebridade, pode ser condenado ao apedrejamento digital. Com isso, pessoas que deveriam ser livres, são   permanentemente vigiadas, como no 1984, de George Orwell, em que o Big Brother(irmão mais velho) é o olho que tudo vê.
            Também é uma espécie de justiceiro, esse olho do celular que vai para as redes. Várias histórias de famosos estão vindo à tona agora.  Kevin Spacey perdeu contrato com a série House of Cards por ter sido acusado de assediar meninos. Ed Westwick, galã da turma jovem, foi alvo de duas atrizes que postaram que foram estupradas por ele. John Travolta também foi acusado de estupro. Harvey Weinstein (produtor de filme) também acusado de assédio por atrizes, assim como Ben Affleck. Serve para intimidar quem pensa que é dono. Em Goiás, há pouco, um jovem matou uma estudante com onze tiros, na sala de aula, porque ela ousara não aceitar seu assédio.
            A novidade pode defender padrões éticos, de civilidade, de respeito às leis. E pode também promover calúnias, perseguições e injustiças. Pode ser usada por partidos políticos, ideologias e seus militantes, contra os que odeiam. Pode vir cheia de preconceitos. Pode trazer absurdos, como considerar homofóbico o Noé bíblico, porque só recolheu casais na arca – nenhuma dupla. Mas onde estaria o equilíbrio, a justiça, a verdade? Nos fatos. Fatos sem alterações, sem edições, sem falsificações. E é preciso não esquecer que entre os direitos e garantias individuais da Constituição, está o inciso X do artigo 5: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. E “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.”  Há covardes se escondendo no anonimato da rede, onde só se encorajam escondidos no anonimato da máscara digital e assim confessam fraqueza e medo do seu alvo.

 

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